PLANO DE PAZ
Depois de travar a guerra será necessário reconstruir a sociedade. Este é o plano que nos permitirá construir a paz social em crise climática.
Serviços básicos incondicionais
Garantir saúde, educação, habitação, alimentação e água, energia renovável e transportes, de forma gratuita, no setor público, para todas as pessoas.
Precisamos de garantir as necessidades básicas para toda a gente, para que todos tenham uma vida digna, numa sociedade justa e num planeta habitável.
Tudo o que toca ao público deve ser público, e a serviço do público, devendo ser retirado do mundo da maximização do lucro.
A melhor medida de adaptação para tempestades é ter uma casa decente. A melhor adaptação para as falhas nas infraestruturas, causadas pela crise climática, é ter um sistema nacional de saúde forte e acessível. A melhor transição energética é a disponibilidade e gratuidade das energias renováveis e dos transportes públicos. A melhor capacitação para a resiliência e para a nossa defesa é ter educação e alimentação gratuitas. Uma boa alimentação ajuda a prevenir doenças.
Assim, para além das medidas já referidas a nível de energia, transporte e habitação, é necessário igualmente:
Garantir programas nacionais e municipais que assegurem o acesso à água e à alimentação dignas e saudáveis para toda a gente.
Tornar o Serviço Nacional de Saúde totalmente gratuito, e de cobertura universal, com reforço do investimento público para um SNS de qualidade. Expandir os serviços de saúde para embarcar problemas de saúde mental e outras áreas negligenciadas, em particular a saúde de pessoas trans, o cuidado para com os mais velhos, o direito à saúde reprodutiva e ao aborto, e o tratamento de dependência de substâncias. Implementar uma descentralização da saúde, por exemplo através do modelo Patient-Centred Care – modelo catalisado pelo modelo de enfermagem local, que empodera enfermeiros a providenciar e gerir cada caso de um modo local, na casa-contexto da pessoa, reduzindo admissões hospitalares na ordem dos 40%. Descentralizar o acesso a cuidados é mais eficiente para: a prevenção, a satisfação das pessoas, a literacia respeitante à saúde, a gestão de recursos, a qualidade dos cuidados, a adequação às necessidades, a resiliência em emergências de saúde pública, a inovação dos cuidados e o engajamento das pessoas nos processos de decisão sobre os serviços.
Gratuidade do ensino público, incluindo o ensino superior, através de investimento público que garanta um ensino de qualidade para todos.
Educação acessível que aumente a literacia e o entendimento das justiças climática e social. Para além da educação formal, garantir diferentes espaços de educação não formal (presencial e digital) como forma de aumentar o conhecimento sobre a crise climática, a justiça racial e a descolonização e questões de género, autonomia sobre o corpo, direitos sexuais e reprodutivos. O conhecimento sobre a prevenção e o tratamento de doenças regulares tem de ser democratizado, fazendo parte da educação.
Leituras Recomendadas:
Serviços Básicos Incondicionais – Anti-corpos – Climáximo - https://arquivo.climaximo.pt/2020/09/21/reivindicacoes-de-emergencia-anti-corpos/
Resgatar o Futuro, Não o Lucro - https://arquivo.climaximo.pt/2020/05/04/resgatar-o-futuro-nao-o-lucro-6-de-junho/
Cuidado no centro da economia, não o lucro
Atualmente vivemos numa crise de cuidados onde as atividades reprodutivas são desprezadas. A construção de paz passa por colocar a vida e o cuidado no centro da economia, ao invés da maximização do lucro.

É preciso pensar noutras formas de produzir e reproduzir, alterando o modelo de produção atual para um modelo focado na necessidade e na distribuição equitativa dos recursos, e não no crescimento infinito e no extrativismo. Para tal, é preciso basear a produção, os cuidados e a distribuição de bens numa economia de distâncias curtas, que contenha a vida, e não o lucro, no seu centro. Essa transformação deve quebrar com a lógica do mercado e ir de mão dada com o controlo democrático dos processos e bens essenciais à vida.
Algumas das medidas que conduzem a tal objetivo são:
Incorporação do valor da vida na tomada de decisões económicas, produzindo apenas de acordo com as necessidades reais das pessoas e dentro dos limites dos ecossistemas. Isto implica uma nova gestão dos recursos naturais, como a água potável, os oceanos, os minérios e o solo. Implica, igualmente, garantir que as novas infraestruturas, em particular as necessárias para a transição energética, tenham o mínimo impacto possível nos ecossistemas e comunidades.
Valorização do trabalho reprodutivo e cuidados e redistribuição de trabalho: Reconhecimento e valorização social de todo o trabalho de cuidados e reprodutivo, que permite a continuação e regeneração da vida. Reconhecer que grande parte do trabalho de cuidados atualmente é protagonizado por mulheres, em especial mulheres migrantes e racializadas. Garantir uma redistribuição do trabalho reprodutivo e das atividades de manutenção, não só dentro de casa, mas também na sociedade. Garantir igualmente a redistribuição nos trabalhos produtivos, tomando medidas para que os empregos criados para travar a crise climática não perpetuem as mesmas desigualdades atualmente existentes.
Planeamento urbano de “curtas distâncias” e desenvolvimento massivo de transportes públicos com as comunidades locais: Planos concebidos para reduzir os movimentos pendulares, diminuindo assim o tempo gasto em transportes e as emissões associadas aos mesmos; construir, com as comunidades locais, uma rede de resposta às suas necessidades (transportes escolares/creches, bem como transportes adequados a pessoas de mobilidade reduzida).
Leituras Recomendadas:
Clima e feminismo: a mesma luta – Climáximo - https://arquivo.climaximo.pt/2021/10/25/clima-e-feminismo-a-mesma-luta/
Contradictions of Capital and Care – Nancy Fraser - https://newleftreview.org/issues/ii100/articles/nancy-fraser-contradictions-of-capital-and-care
Crise ecológica, Coronavírus e cuidado. O que aprendemos sobre “trabalho essencial” e como isto pode afetar a campanha Empregos Para o Clima – Stefania Barca - https://www.empregos-clima.pt/crise-ecologica-coronavirus-e-cuidado-o-que-aprendemos-sobre-trabalho-essencial-e-como-isto-pode-afetar-a-campanha-empregos-para-o-clima-stefania-barca/
Transição justa
Quem trabalha atualmente nos setores que precisam ser desmantelados, reconfigurados ou reduzidos não ficará para trás. A transição justa é baseada na equidade e na justiça, reparando os danos do passado e garantindo a subsistência dos\as trabalhadores\as e das comunidades no futuro, enquanto, ao mesmo tempo, se concretiza a necessária transição de uma economia extrativista para uma sociedade climaticamente segura, construindo poderes económico e político que consolidem uma economia regenerativa.
Uma política climática dirigida pelas empresas – o que tivemos até hoje – só produz uma expansão energética. Para uma transição energética justa e rápida, precisamos de políticas públicas guiadas pela ciência climática, dirigidas para a justiça social, e lideradas pelos trabalhadores e pelas comunidades locais.
Precisamos de mobilizações a nível internacional, nacional, regional e nas empresas. Estas frentes não só são complementares para um plano de transição justa e coerente, como também cada uma pode conduzir a avanços noutras. Será necessário criar uma Comissão Nacional de Justiça Climática com poder deliberativo, que exclui a indústria de combustíveis fósseis e privilegia a ciência e a sociedade civil, para planear e gerir o programa de transição justa.
Um programa de transição justa deve incluir:
Formação profissional em Empregos para o Clima que comece agora e que abranja todos os trabalhadores
Levantamento das competências e necessidades por empresa, tendo em conta os potenciais de transição de cada região
Valorização e certificação das competências de todos os trabalhadores
Criação de comissões de transição justa em cada território e em cada instalação que privilegiem os trabalhadores
Compensações que correspondam às necessidades específicas, nomeadamente um subsídio de emprego mais prolongado para trabalhadores mais velhos e apoio à mobilidade geográfica
Salário completo até ao novo emprego para todos os trabalhadores cujos postos de trabalho sejam extintos pela transição
Inclusão de cláusulas nos projetos e leilões de energias renováveis que obriguem a empregar os trabalhadores da indústria de combustíveis fósseis
Responsabilização das empresas e dos acionistas para os custos da transição
Prioridade de emprego nos novos postos de trabalho na área para todos os trabalhadores cujos postos de trabalho sejam extintos pela transição
Controlo público e gestão democrática das novas tecnologias, como as energias renováveis e o hidrogénio
Leituras Recomendadas:
Trade Unions for Energy Democracy - https://www.tuedglobal.org/
Por uma Transição Justa em Sines – Empregos para o Clima - https://www.empregos-clima.pt/estudo-sines/
Trade Unions and Just Transition: The Search for a Transformative Politics – Sean Sweeney and John Treat - https://www.tuedglobal.org/working-papers/trade-unions-and-just-transition-the-search-for-a-transformative-politics
Democracia energética
Democracia Energética é um conceito que é definido procurando garantir um setor energético assente em três pilares: (1) fontes de energia limpas e sustentáveis, (2) propriedade pública, e (3) gestão democrática. Isso significa um sistema energético que salvaguarde as necessidades energéticas das populações e das comunidades e que, ao mesmo tempo, permita travar a crise climática.
Parar a guerra climática e construir uma verdadeira paz implica repensar a forma como nos relacionamos com a energia e gerimos os nossos sistemas energéticos. Como o seu ponto de partida é a descarbonização, pressupõe reorientar as nossas sociedades para entendermos a energia como um bem comum e não como uma mercadoria.
Esta transformação social significa abandonar a perspetiva extrativista em vigor, ter um foco nas necessidades reais das gerações atuais e futuras, bem como construir uma gestão pública e democrática dos sistemas energéticos. Tal inclui nacionalizações, municipalizações e comunidades energéticas.
Leituras Recomendadas:
Trade Unions for Energy Democracy - https://www.tuedglobal.org/
A base para uma transição justa: Democracia Energética – Sinan Eden - https://www.empregos-clima.pt/base-para-uma-transicao-justa-democracia-energetica-sinan-eden-climaximo/
Coopérnico - https://www.coopernico.org/
Jornadas pela Democracia Energética - https://democracia-energetica.pt/
Justiça racial e de género em todos os processos políticos e sociais de transição e transformação
Atualmente o racismo e o patriarcado são estruturais. Isto significa que, devido ao privilégio historicamente acumulado e à cultura reproduzida, as políticas públicas, as práticas institucionais, as representações culturais e outras normas, reforçam estas mesmas opressões. É, portanto, necessário termos ferramentas que permitam desmantelar estes sistemas de opressão. Entre elas inclui-se a monitorização dos processos políticos e sociais de transformação, de forma a garantir que estes assegurem a construção de justiça racial e de género.

Vivemos numa sociedade com diversos sistemas de opressão – racismo, patriarcado, capacitismo, entre outras. Parte do trabalho de construção de paz é quebrar e mitigar estas opressões, criando formas igualitárias de relações entre nós. Para além das diversas medidas de justiça racial e de género apresentadas neste plano, é ainda necessário garantir que, em todos os passos, há uma participação ativa dos grupos oprimidos – nas discussões, decisões, implementação e monitorização.
Sabemos que o caminho faz-se caminhando. A construção da paz só poderá levar às justiças racial e de género se colocarmos esta componente como prioritária.
Para tal, uma das medidas propostas é a criação de Comissões de Igualdade Climática em todos os processo de transição justa, a nível nacional, regional e local, que estabeleçam e monitorizem critérios claros de justiças de género e racial, em todos os processos políticos e sociais de transição, bem como nos processos internos das restantes comissões.
Leituras Recomendadas:
Transição Justa e Democracia Energética: a perspetiva de um sindicato da função pública - Public and Commercial Services Union - https://www.empregos-clima.pt/transicao-justa-e-democracia-energetica-perspetiva-de-um-sindicato-da-funcao-publica/
Ferramentas, investigação, dicas, currículos e ideias para pessoas que queiram aumentar a sua própria compreensão sobre a justiça racial a todos os níveis - em sistemas, organizações, comunidades e como cultura em geral. https://www.racialequitytools.org/
Justiça transformativa
Numa sociedade onde a violência é normalizada e o sistema jurídico, judicial e penal perpetuam diversas formas de opressão e violência como o patriarcado e o racismo, é preciso uma transformação social. A justiça transformativa permite transformar o modo como respondemos à violência sem criar mais formas de violência. Tem como intuito o garantir da segurança imediata da pessoa que foi alvo de violência, parando imediatamente os abusos, levando à responsabilização dos perpetradores de violência e à sua reabilitação. Passa igualmente pela reabilitação das comunidades e pela reparação face à violência já sofrida.
Assim, é necessário reformular o sistema jurídico, judicial e penal fazendo-o assentar sobre justiça transformativa. Tal passa por:
i) Garantir a reabilitação e reintegração das pessoas atualmente encarceradas;
ii) Recorrer a medidas de justiça transformativa como instrumento de responsabilização para reconciliar os infratores com as suas vítimas e anular ou compensar os danos causados, sempre que possível;
iii) Colocar o financiamento atualmente alocado a prisões em programas sociais transformativos que permitam uma regeneração da sociedade, com soluções públicas para problemas públicos.
Leituras Recomendadas:
Are Prisons Obsolete? - Angela Y. Davis: https://collectiveliberation.org/wp-content/uploads/2013/01/Are_Prisons_Obsolete_Angela_Davis.pdf
Abolitionist Futures (session 4: transformative justice and abolition): https://abolitionistfutures.com/full-reading-list/#session4
Transform Harm: https://transformharm.org/
Transformative Justice: A brief description”. Disponível em: https://transformharm.org/transformative-justice-a-brief-description/
ICRC sobre prisões https://shop.icrc.org/prison-maintenance-guide-pdf-en.html
Responsabilizar as empresas das indústrias poluentes, os CEOs, os acionistas e os políticos pela crise climática
As empresas, CEOs, conselhos administrativos e acionistas das indústrias poluentes, bem como os seus representantes políticos culpados pela crise climática, e que lucraram (e lucram) com ela, têm de ser responsabilizados pela destruição social e ecológica que causaram (e ainda causam).

As empresas, os CEOs e os acionistas das indústrias poluentes sabem, há décadas, que os seus negócios estão a destruir as condições físicas e químicas do planeta. Os governos sabiam que as suas políticas públicas iam resultar no colapso da civilização.
A guerra climática que eles declararam contra as pessoas e o planeta não é algo que só vá acontecer no futuro. A destruição já está a acontecer através das cheias, das ondas de calor, dos incêndios, das secas e das tempestades. Para além disso, o planeta continua a aquecer, devido às emissões de GEE mais recentes, cujos efeitos só vão ser realmente visíveis nas próximas décadas.
Tendo em conta que as empresas sabem da crise climática desde os anos 70, e que o consenso científico sobre a mesma foi estabelecido nos anos 90, temos de analisar como foram utilizados os poderes económicos e políticos desde essa altura: por quem, para quê, com que efeito?
Parar as suas armas de destruição em massa não será suficiente. Os culpados devem ser responsabilizados pelos danos causados pelas suas decisões passadas.
Esta responsabilização inclui:
Rejeição de qualquer tipo de compensações aos acionistas, aos conselhos administrativos, aos CEOs e aos empresários privados;
Cobrar aos acionistas e aos CEOs das empresas fósseis os impactos da crise climática como as secas, as tempestades, as inundações e os incêndios;
Responsabilização das empresas de celulose, The Navigator Company, Altri Florestal e membros maioritários da BIOND, pelos danos causados pelos incêndios e custos a elas associados nas últimas décadas, nomeadamente relacionados com reparações sociais e florestais necessárias;
Investigação das instituições financeiras envolvidas na gestão e fornecimento de investimento para os projetos destrutivos;
Investigação do portfólio dos acionistas das empresas ligadas aos negócios destrutivos para encontrar as ligações comerciais que revelam cumplicidade;
Aprovação de uma Lei de Ecocídio que legisla o tratamento destas situações no futuro.
Leituras Recomendadas:
Exxon Knew - https://exxonknew.org/
Shell Knew - https://www.desmog.com/shellknew/
Carbon Tracker - https://carbontracker.org/
Bank Track - https://www.banktrack.org/
Stop Ecocide - https://www.stopecocide.earth/
Reconhecer e pagar a dívida histórica ao Sul Global
Reconhecer a dívida histórica de Portugal respeitante à colonização e a dívida ecológica relacionada com as suas emissões. Pagar aos povos pelas perdas e danos, e reconhecer os impactos políticos, culturais, sociais e económicos da exploração colonial, bem como estabelecer reparações que apoiem uma transição justa, sem colocar em causa a sua soberania.
Dizemos que os governos e as empresas declararam guerra contra as pessoas e o planeta. E isso é completamente verdade.
Antes de atingir os tamanhos planetários, esta destruição total já havia sido feita pelos países do Norte Global nos países do Sul Global. Para além disto, os mesmos povos estão agora na linha de frente do colapso climático.
Construir a paz implica reparar os danos, restaurar a confiança entre os povos e transformar as nossas relações, tendo por base a solidariedade e o cuidado.
Para tal, é necessário:
Pagar a dívida histórica e ecológica aos países do Sul Global, não sob a forma de mais empréstimos, mas de subvenções sem juros, e sem colocar em causa a sua soberania;
Estabelecer mudanças estruturais na nossa sociedade para reparar séculos de racismo estrutural, colonialismo e imperialismo;
Introdução de reparações para comunidades, povos e ecossistemas afetados pelo colonialismo, globalização e exploração, reconhecendo que existem dívidas históricas e ecológicas que devem ser pagas ao Sul Global, e que o que causou tais dívidas deve ser travado;
Solidariedade e apoio aos povos e comunidades nas linhas da frente da luta contra a crise climática e contra as empresas e os governos responsáveis pelas perdas e danos nestas comunidades;
Defender a soberania alimentar como direito dos povos de definir a sua política agrícola e alimentar, sem qualquer “dumping” em relação a terceiros países;
Recuperar o conhecimento das comunidades indígenas, promovendo os efeitos benéficos da atividade humana pragmática sobre os ciclos de vida e os ecossistemas.
Direitos e liberdade de movimento para as pessoas, não para o capital
Defendemos a proteção, liberdade de movimento e os direitos sociais, políticos e cívicos de todas as pessoas migrantes.
Para tal é necessário:
Abrir fronteiras e estabelecer processos simples e transparentes para acolher migrantes;
Criação de rotas seguras, com meios dignos de viagem e proteção humanitária para todas as pessoas migrantes.
Acesso imediato a todas as pessoas migrantes aos direitos básicos (serviços básicos, direito à associação, direito ao trabalho, etc.) e de participação e decisão na comunidade, bem como no espaço de trabalho. Acesso aos restantes direitos da cidadania ao fim da residência por um período de 2 anos.
Leituras Recomendadas:
Connecting Climate Justice & Migrant Justice: A Guide to Countering Dangerous Narratives - https://www.migrantsorganise.org/connecting-climate-justice-migrant-justice-a-guide-to-countering-dangerous-narratives-report-launch/
Regenerar os Ecossistemas
Os governos e as empresas declararam guerra contra as pessoas e ao planeta. Ao pôr fim a essa guerra, a paz que queremos construir vai ter que ser construída a partir de uma nova forma de relacionamento entre as pessoas e os ecossistemas. O capitalismo ensinou-nos a olhar os ecossistemas como ele o faz: material para explorar e através do qual produzir lucro. Nós vamos precisar de encontrar novas formas, ou redescobrir formas bem antigas de nos relacionarmos com o território e com os recursos naturais, garantindo a regeneração dos ecossistemas.

Há diversas medidas que é necessário tomar, como por exemplo:
Conversão de áreas de eucalipto e pinhal abandonado em florestas e bosques com diversas espécies autóctones, em regime de policultura. Em Portugal, implementar uma floresta nativa e resiliente passa por regenerar 700 mil hectares de área de eucalipto - que correspondem fundamentalmente ao que tem sido abandonado - e transformar essas áreas em floresta e bosque resiliente que aguente o futuro mais quente e mais seco que a crise climática produziu. Para tal, essas áreas serão convertidas em florestas com diversas espécies autóctones, como carvalhos, castanheiros, cerejeiras e sobreiros. Para além disso, é preciso reduzir o abandono das terras e garantir rendimento aos produtores. É de notar que o eucalipto seria utilizado, entre outras opções, para ser integrado no solo, na produção de madeira, e como apoio temporário na transição energética, sendo enviado para as centrais atuais de biomassa municipais.
Regeneração de solos agropecuários para garantir a sua saúde, resiliência e capacidade produtiva. Isto passa, entre outras coisas, por adotar práticas de agricultura regenerativa, agrofloresta, permacultura, e práticas de regeneração de solos e ecossistemas.
Recuperação dos ecossistemas marinhos colapsados ou sobre-pescados e restabelecimento de habitats sensíveis (como, por exemplo, recifes de coral). Para tal, contribuir para a criação de uma rede global de áreas marinhas protegidas que proteja efetivamente pelo menos 30% dos mares e zonas costeiras a nível mundial.
Os rios portugueses, desde a nascente até à foz, devem ser geridos democraticamente permitindo a renaturalização onde esta seja possível e o acesso público. Devem também ser impostos limites de produção em situações onde o stress hídrico/poluição coloquem em risco a biodiversidade da fauna e da flora.
Revalorizar o bem comum – arte, desporto e lazer
Na construção de um clima de paz, vamos ter de repensar na nossa forma de nos relacionarmos entre nós e com os objetos que nos rodeiam. A sociedade de consumo dará lugar às sociedades de bem-estar e buen vivir.
Para tal é necessário recuperar os espaços públicos, valorizar a arte, garantir a cultura, o desporto e o lazer acessíveis para todas as pessoas, tal como acabar com patentes.
A revalorização do bem comum passará por:
Investimento a grande escala em espaços públicos como parques, teatros comunitários, centros de lazer e locais de desporto;
Desenvolvimento de programas acessíveis e comunitários à cultura, arte e desporto;
Abolir patentes para permitir a transferência de tecnologias de baixo carbono que facilitem a mitigação e adaptação global.
Leituras Recomendadas:
Buen vivir / Sumak kawsay - https://en.wikipedia.org/wiki/Sumak_kawsay
Reclaiming the Computing Commons – Rob Hunter - https://jacobin.com/2016/02/free-software-movement-richard-stallman-linux-open-source-enclosure/
Cidadania ativa
Participação de todas as pessoas nos processos de decisão, reabilitação da sociedade e construção da paz.

Uma sociedade desenhada para explorar e destruir é uma sociedade de alienação, em que as pessoas são roubadas das suas capacidades. Com o tempo, começamos a achar que não somos capazes – de tomar decisões, de planear as nossas vidas, de procurar o interesse comum em diálogo construtivo. O outro lado da moeda é que começamos a achar que “os outros” também não são capazes das mesmas coisas – por não serem brancos o suficiente, por serem mulheres, por não terem tido um ensino específico que nós valorizamos, por serem jovens, por serem velhos, por não falarem uma língua específica que nós decidimos que importa, e por mil outras razões arbitrárias, circunstância que nunca se aplica se a outra pessoa for rica o suficiente.
Abordaremos essa questão de várias formas para construirmos uma nova relação de poder entre nós que não privilegie bullies como Elon Musk ou Donald Trump, não desresponsabilizando quem decide destruir as condições físicas e químicas dum planeta habitável.
Para tal consideramos necessário:
- Garantir que temos tempo dedicado à comunidade: Redução do horário laboral obrigatório para dedicarmos tempo para nos conectarmos com as nossas comunidades, participarmos nas decisões do nosso condomínio, do nosso bairro, da nossa aldeia e da nossa cidade.
- Garantir democracia: eleições legislativas que acontecem duas ou três vezes por década não podem ser o único momento político relevante. Em primeiro lugar, temos de redistribuir o poder político nas nossas sociedades em vez de delegá-lo aos políticos profissionais. Em segundo lugar, a política tem de ser parte integrante das nossas vidas e não algo que fazemos duas ou três vezes por década. Em terceiro lugar, os prazos climáticos para definir, planear e executar os planos de desarmamento climático são incompatíveis com o ritmo arcaico do sistema eleitoral atual. Teremos de encontrar, juntas, diversas formas de implementar a democracia direta. Alguns movimentos sociais e alguns cientistas desenvolveram as Assembleias de Cidadãos como uma das ferramentas de resposta a esta necessidade. Em paralelo, ao nível municipal, apresenta-se igualmente a necessidade de organizar assembleias de cidadãos para debate, decisão e implementação das políticas locais. As assembleias de cidadãos são assembleias criadas por sorteio que são demograficamente representativas. As assembleiasreúnem-se ao longo de múltiplos dias, para estudar um tema, consultar especialistas e o público geral, e depois desenvolver um conjunto de recomendações. O mandato, a responsabilidade e as decisões destas assembleias terão de ser tomados dentro dos limites da ciência climática, atendendo às necessidades coletivas e de justiça global.
Garantir a participação de todas as pessoas: para além das medidas de justiças de género e racial, tal como o acesso a decisões por parte das pessoas migrantes, é necessário garantir que: as pessoas com deficiências não são excluídas ou tratadas com condescendência; as pessoas idosas não são excluídas, bem como as crianças; o teu percurso académico e profissional não dita o poder que tens sobre as decisões comuns.
Nota sobre a participação de crianças: Estamos habituados a tratar os direitos das crianças como os direitos dos dependentes dos adultos. Até aos 18 anos, és menor de idade. Depois, dum dia para o outro, já és adulto e, de repente, tens todos os deveres e responsabilidades dum cidadão.
Num contexto de colapso climático, nada pode ser mais injusto do que isso. Se o Estado Português cumprir os seus planos de clima, o orçamento do carbono de Portugal vai acabar durante esta década. Que sentido faz dizermos a alguém com 10 anos que só pode participar nas decisões políticas daqui a 8 anos, quando o que está em causa é exatamente o futuro que vai ser determinado nos próximos 8 anos? A separação binária por uma idade é aleatória e inaceitável (e, na verdade, extremamente recente). E também não funciona: se queremos ter adultos responsáveis, então temos de tratar as pessoas como adultos duma forma faseada, dando-lhes poder verdadeiro sobre assuntos que lhes afetam.
Por exemplo, uma criança de 8 anos deve ter voz sobre a sua educação, sobre o seu corpo e sobre a sua vida familiar. Um adolescente de 15 anos muitas vezes tem uma melhor perspetiva sobre o que é bom para o seu bairro do que os seus pais.
Vamos ter de experimentar e descobrir como redistribuir o poder político entre nós. Vai ser desconfortável para os supostos “adultos” que nos trouxeram até aqui. Mas não será tão desconfortável como o será para os jovens de hoje que viverão o colapso climático de um modo bem mais exacerbado.
Leituras Recomendadas:
Assembleias de Cidadãos Portugal - https://www.assembleiasdecidadaos.pt/
O Que São as Assembleias de Cidadãos? - https://www.forumdoscidadaos.pt/o-que-fazemos/o-que-sao-as-assembleias-de-cidadaos/