Skip links

Alemanha na vanguarda da criminalização do ativismo na Europa, descredibilizando todo o aparelho jurídico e atacando a sociedade civil como um todo

Letzte Generation, coletivo pela justiça climática que tem organizado várias ações diretas não-violentas para alertar a sociedade para a crise climática, está sob acusação de “organização criminosa”. Pela primeira vez, as autoridades alemãs aplicam o enquadramento legal do crime organizado violento ao ativismo climático.



A Letzte Generation (a Última Geração, em português), membro da rede A22 (da qual fazem parte também campanhas como Just Stop Oil, Insulate Britain, Derniér Renovation, Riposte Alimentaire, Ultima Generazione), tem mobilizado milhares de pessoas em centenas de ações nos últimos anos, com o objetivo de alertar para o estado de emergência climática e o papel criminoso do governo alemão no colapso climático.

No ano passado, a polícia alemã fez buscas em casas de seis ativistas, confiscando todos os materiais (computadores, cadernos, servidores, telemóveis) relacionáveis com ativismo, baseando-se numa acusação vaga de terrorismo. O procurador chegou, inclusivamente, a ordenar a suspensão do website do coletivo, colocando online uma nota segundo a qual a Letzte Generation era uma organização terrorista e qualquer apoio implicava cumplicidade com o terrorismo – ou seja, no dia de começo do processo, o procurador já retirava e divulgava todas as suas conclusões, em violação flagrante do Estado de Direito.

No mês passado, a acusação chegou, finalmente, às ativistas. A acusação não se limita a afirmar que as pessoas envolvidas criaram uma organização e praticaram ações criminosas. Afirma, mais do que isso, que as ativistas se organizaram com o objetivo único de praticar crimes. Mais concretamente, o procurador alega que um coletivo abertamente organizado, que comunica de forma transparente os seus propósitos (apresentando no respetivo website a sua estrutura interna e os nomes das coordenadoras das equipas) e que tem realizado centenas de ações sobre a crise climática e cujos membros já foram detidos dezenas de vezes por dizerem a verdade sobre a emergência climática, é, na verdade, uma organização cujo único intuito é derrubar o governo, utilizando o clima como mera fachada. Obviamente este disparate será impossível de provar (o Ministério Público refere-se a ações em que as pessoas participantes tinham as caras bem visíveis, divulgadas com vídeos em direto nas redes sociais, explicando o que estão a fazer e o porquê; não se baseia em ações encobertas ou furtivas). Não obstante, o comunicado lançado serve já como campanha política para criminalizar os protestos a partir de agora.

Se a acusação for aceite pelo Tribunal e se as ativistas forem condenadas pelo juiz, qualquer apoio à Letzte Generation (donativos, distribuir panfletos, partilhar links para donativos) seria crime. Além disso, como as pessoas acusadas são também ativas em outras lutas, todos os movimentos sociais estariam implicados. É a primeira vez que esta lei, desenhada para organizações de natureza mafiosa, está a ser usada contra ativistas: o uso que o Ministério Público está a fazer da norma legal já é, em si mesmo, um escalamento. Por conseguinte, se o Tribunal aceitar a interpretação do Ministério Público, qualquer coletivo social estará sob ameaça de semelhante acusação, o que, obviamente, resulta num efeito dissuasor e repressivo significativo.

O Climáximo repudia e reconhece a repressão estatal. O sistema jurídico é um aparelho político desenhado para manter o sistema destrutivo não-questionado e não-desafiado. Como o caso da Alemanha mostra, a aplicação de regimes opressivos não depende de governos de extrema-direita – no contexto da crise climática, os governos de direita, do centro e de centro-esquerda também alinham com tal retórica.

O Climáximo insiste num debate público sobre os mitos da imparcialidade dos tribunais e da garantia e proteção dos direitos humanos pelos Estados europeus.

Leave a comment