PLANO DE DESARMAMENTO: PARAR A PROLIFERAÇÃO
Este é o primeiro passo. Trata-se de medidas que podem e têm de ser tomadas hoje, e que travam a expansão da indústria fóssil e das suas armas.
Nem mais um projeto que aumente emissões de gases com efeito de estufa
Cancelar imediatamente qualquer projeto que aumente emissões em grande escala em Portugal, inclusive a expansão do terminal de GNL em Sines, o novo aeroporto e expansões portuárias e aeroportuárias, e instituir uma moratória que proíbe projetos futuros desta natureza. Não permitir a transferência das emissões de Portugal para outros países através de novos projetos de extração e exploração de combustíveis fósseis.
Existem reservas conhecidas de combustíveis fósseis para levar-nos a um planeta 6 a 9 ºC mais quente. Em particular, o Ártico ficaria 17ºC acima da temperatura atual. Destas reservas, apenas queimar as que já estão em exploração, levar-nos-á para além dos 2ºC, mesmo se não houver qualquer novo projeto.
Nós estamos neste momento com 1.2ºC de aquecimento, e os cientistas climáticos estão a falar de termos entrado num território desconhecido. A linha vermelha por um planeta habitável seria encerrar pelo menos 60% das infraestruturas de combustíveis fósseis existentes a nível global.
Sabendo disso, as empresas multinacionais (como Total, ENI, Equinor, BP, Shell, Petrobras e também a Galp) continuam a investir mais e mais dinheiro em combustíveis fósseis. A mesma história é válida no caso de aviação, automóveis e pecuária.
Uma coisa é ter uma fábrica de armas nucleares aberta e funcional, a mandar bombas regularmente. Outra é inaugurar novas fábricas de armas nucleares. Os novos projetos são o sinal mais óbvio dado pelos governos e as empresas: a destruição planetária é um ato deliberado e coordenado.
Em concreto, em Portugal, esta medida implica o cancelamento e proibição de:
Expansão do terminal de gás fóssil liquefeito em Sines: Os planos de tornar Portugal numa das principais portas de entrada de gás fóssil para a Europa têm de ser travados;
Construção e ampliação de aeroportos: É necessário um decrescimento em mais de 90% da aviação, por isso é inútil a expansão do aeroporto de Lisboa e/ou a deslocação deste para outro local, assim como a construção de novos aeroportos;
Construção e ampliação de gasodutos: Neste momento há planos para construção de um novo gasoduto de Celorico da Beira até Zamora. Os gasodutos de hidrogénio são uma mentira descarada. Por um lado, todos os gasodutos atuais em Portugal (que deviam estar a ser desmantelados) transportam, por questões técnicas, no máximo 10% de hidrogénio. Restam 90% do espaço ocupado necessariamente por gás fóssil, um dos principais contribuintes para a crise climática. Por outro, não há vantagens técnicas no transporte de hidrogénio por longas distâncias. (podes ler porquê AQUI)
Expansão da agricultura intensiva com mão-de-obra escrava no Sudoeste Alentejano: É necessário parar imediatamente a exploração e escravatura, tal como a expansão de monoculturas com uso intensivo de insumos externos;
Expansão de monoculturas de eucaliptos: A indústria do papel é responsável por grandes quantidades de emissões – sendo a Navigator a empresa que mais emite em Portugal –, e pela destruição da floresta biodiversa. Novas plantações de eucaliptos equivalem a novas bombas relógios colocadas pela indústria do papel, que, quando explodem, matam centenas de pessoas, queimam casas e libertam ainda mais CO2;
Construção de novas centrais de produção de energia através de biomassa: Os projetos de biomassa baseiam-se na ideia de que plantar e destruir florestas é uma alternativa viável a cortar emissões. Não é! As florestas são importantes sumidouros de CO2 e cumprem várias funções essenciais à sustentabilidade dos ecossistemas;
Construção de novas autoestradas: Representam o vício criado pelas empresas fósseis e de automóveis. Elas são caras, implicam mais material igualmente emissor e desviam financiamento público da manutenção e crescimento da ferrovia e de outros projetos de transporte coletivo renovável;
Exploração de minérios em mar profundo em águas territoriais e internacionais;
Contratos atuais de exploração de lítio (e outros minerais) em Portugal: Estes contratos fazem parte de um plano de expansão energética, empiricamente visível pelo mundo inteiro e também em Portugal. Rejeitamos uma discussão abstrata sobre lítio. Só depois do cancelamento destes contratos é que estamos dispostas a falar sobre o lítio como algo estratégico para políticas energéticas – através de democracia energética que garante que as decisões sejam tomadas pelas pessoas, incluindo as comunidades locais, e para as pessoas, tendo em consideração o que são as necessidade reais e as alternativas existentes. Os contratos atuais assinados não referem qualquer substituição efetiva de carros a combustão nem qualquer outra transição – assim, não só não cortarão emissões como irão aumentar o consumo desnecessário. O lítio (e os outros minerais) vão ser extraídos para ser vendidos no mercado. Neste momento a venda de carros elétricos está a aumentar, mas os SUVs também. O que está a acontecer é um aumento de carros em trânsito – o que não é nenhuma transição. Se as empresas ganharem o conflito, apenas está garantido que se vão vender mais carros elétricos (e mais telemóveis). Isto não é uma política climática. É um negócio de extração de recursos naturais.
Expansão de extração de combustíveis fósseis de empresas portuguesas em qualquer território: Apesar do movimento climático ter ganho a batalha contra a exploração de combustíveis fósseis em Portugal, hoje a Galp tem projetos de novas explorações de combustíveis fósseis no Sul Global, nomeadamente em Moçambique, Angola e Brasil. Adicionalmente a Mota-Engil tem estado, muitas vezes, envolvida na construção destas infraestruturas.
Leituras Recomendadas:
The Sky’s Limit – Oil Change International, 2023: https://priceofoil.org/2023/08/16/skys-limit-data-update-shut-down-60-of-existing-fossil-fuel-extraction-to-keep-1-5c-in-reach/
Fossil Fuel Non-Proliferation Treaty, 2019: https://fossilfueltreaty.org/
Relatório Drill Baby Drill – Glasgow Agreement, 2022: https://glasgowagreement.net/en/drillbabydrill/
Fim a todos os investimentos públicos em fósseis
O dinheiro público tem de deixar de ser usado para financiar o colapso social e climático. Atualmente o estado português gasta 3.3 milhões de euros por dia em subsídios para os combustíveis fósseis.
Este investimento tem de ser transferido diretamente e imediatamente para travar a crise climática.
Cada euro dado aos combustíveis fósseis é um euro roubado à transição justa. E quando dizemos “cada euro”, na verdade estamos a falar de um apoio estatal de 13 milhões de euros por minuto (sendo 7 biliões de euros por ano) a nível global. Os subsídios fósseis estão a aumentar. Isto é: os governos, sabendo da emergência climática, estão a dar ainda mais dinheiro ao colapso civilizacional.
Ao mesmo tempo, os 60 maiores bancos mundiais financiaram os combustíveis fósseis por 5,5 mil milhões de milhões de dólares desde a assinatura do Acordo de Paris. Só em 2022 deram 669 mil milhões de dólares à indústria fóssil.
A mesma história aplica-se à aviação, à agricultura industrial, à mobilidade e ao aparelho militar. E tudo que se diz sobre os governos mundiais sobre este caso aplica-se, letra por letra, ao Estado Português.
Isto é uma situação reveladora: se as empresas e os bancos falam da transição como uma abstração enquanto põem mais lenha no fogo, qual seria uma reação adequada? Se os governos assinam papéis sobre o clima, mas simultaneamente dão dinheiro a quem põe fogo na nossa casa, isto deixa de ser crime por inação: já se torna crime premeditado e coordenado.
Numa sociedade sensata, tudo isto devia ter acabado há décadas. Nomeadamente,
• Fundos públicos de “transição justa” a serem dirigidos para as empresas fósseis;
• Subsídios indiretos anuais à Galp e outras empresas de energia;
• Isenções fiscais aos transportes aéreo, por terra e marítimo;
• Benesses no uso de combustíveis fósseis em processos industriais;
• Subsídios à produção de energia a partir de gás fóssil;
• Apoios à agricultura, pecuária e à pesca praticadas de forma insustentável;
• As Parcerias Público-Privadas nas autoestradas que, para além de receberem rendas públicas, comprometem planos para a mobilidade de que precisamos.
Adicionalmente, é necessário cortar o apoio financeiro à NATO com o fim de desmantelar a indústria bélica – sendo uma das mais poluentes, para além de responsável por ataques contra a Humanidade.
Este dinheiro tem de estar ao serviço da paz: ao serviço da transição energética, democracia energética e serviços públicos.
Leituras Recomendadas:
Fossil Fuel Subsidies Surged to Record $7 Trillion – International Monetary Fund - https://www.imf.org/en/Blogs/Articles/2023/08/24/fossil-fuel-subsidies-surged-to-record-7-trillion
Eliminating Tax Exemption [on Aviation] – Stay Grounded - https://stay-grounded.org/eliminating-tax-exemptions/
Banking on Climate Chaos – Fossil Fuel Finance Report 2023: https://www.bankingonclimatechaos.org/
Fim às emissões de luxo
Parar o uso de jatos privados, carros de luxo, e iates. Todo o luxo presente em atividades de altas emissões constitui uma tentativa de acentuar a desigualdade na raiz da crise climática.
Os bilionários emitem um milhão de vezes mais do que uma pessoa média. Isto não acontece porque comem um milhão de pastéis de nata por dia e não reciclam o alumínio. Acontece, sim, porque têm uma economia de luxo montada exclusivamente à volta deles, completamente desconectada da esmagadora maioria da população: são 90% do mundo inteiro versus 125 indivíduos.
A ONU aponta que os ultra-ricos têm de cortar mais de 97% das suas emissões, mas o consumo de luxo nunca esteve tão alto. Eles sabem o que estão a fazer: uma viagem de jato privado entre Londres e Nova Iorque emite mais CO2eq do que uma família portuguesa num ano inteiro.
No momento histórico em que nos encontramos, cada viagem de jato ou super-iate pode facilmente ser classificada como um míssil atirado aos pobres aleatórios pelo mundo inteiro. O uso dos produtos de ultra-luxo deve ser criminalizado, de acordo com criminilogistas. Mas, na verdade, está a aumentar e a bater novos recordes.
É simples: abolição do uso de jatos privados, carros de luxo e iates.
Leituras Recomendadas:
Ban Private Jets. End Luxury Emissions. – Stay Grounded - https://stay-grounded.org/ban-private-jets/
A billionaire emits a million times more greenhouse gases than the average person – Oxfam report – https://www.oxfam.org/en/press-releases/billionaire-emits-million-times-more-greenhouse-gases-average-person
Lynch, M. J., Long, M. A., Stretesky, P. B., & Barrett, K. L. (2019). Measuring the Ecological Impact of the Wealthy: Excessive Consumption, Ecological Disorganization, Green Crime, and Justice. Social Currents, 6(4), 377-395. https://doi.org/10.1177/2329496519847491
Fim ao consumo desnecessário
Parar imediatamente consumos sem utilidade social e com um grande impacto a nível de emissões, gasto de água doce e destruição de territórios e ecossistemas, como os cruzeiros, “brindes” inúteis, campos de golfe e os voos Lisboa-Porto.
O estilo de vida afluente da classe média no Norte Global foi criado à imagem dos ultra-ricos: consumismo à procura de felicidade. Com isso, os 10% mais ricos produzem metade das emissões de CO2, a nível global e também dentro dum país.
O incentivo e manutenção de consumos de altas emissões desnecessários constitui uma tentativa ativa de estabelecer uma sociedade viciada na sua destruição.
Têm de acabar:
Voos de curta distância (ex. Lisboa-Porto) que têm já hoje múltiplas ligações de ferrovia.
Viagens de cruzeiro que emitem tanto como 1 milhão de carros.
Campos de golfe, que ameaçam hoje o acesso à água potável e acesso a água para agricultura.
Empreendimentos turísticos de luxo com altos consumos de água e energia, ou associados à destruição de ecossistemas e zonas protegidas (ex: destruição das dunas no Alentejo litoral Norte).
Produção de plásticos de uso único não essenciais;
Carros SUV, que todos os anos, emitem 700 megatoneladas de CO2, aproximadamente a produção total do Reino Unido e dos Países Baixos juntos. Se todos os condutores de SUV se juntassem para formar o seu próprio país, este seria o sexto maior emissor do mundo.
Leituras Recomendadas:
“Bullshit Flights”: A debate on legitimate air traffic – Stay Grounded - https://stay-grounded.org/bullshit-flights-a-debate-on-legitimate-air-travel/
SOS quinta dos ingleses: https://www.sosquintadosingleses.com/ Dunas Livres: https://dunaslivres.pt/
Parar os despejos e as deportações
Todas as pessoas têm um direito inegável à habitação e à terra – que são uma condição básica de sobrevivência. Retirar pessoas de onde estão a viver, seja através de despejos ou de deportações, é um ato contra a vida.
Viver em crise climática é viver em convulsões ambientais, políticas e sociais. Expulsar as pessoas das suas casas, das suas comunidades ou de onde moram é colocá-las no meio das cheias, ondas de calor, conflitos sociais e precariedade.
É preciso acabar com os despejos, as desocupações e as demolições sem alternativa de habitação digna que preserve o agregado familiar na sua área de residência. (Consulta Stop Despejos para mais informações sobre a luta para parar os despejos em Portugal.)
Do mesmo modo, numa altura em que há dezenas de milhões de pessoas refugiadas climáticas, e sabendo que este número aumentará para mil milhões antes de 2050, é necessário parar as deportações. Deportar pessoas é condená-las às condições sociais, económicas, políticas ou climáticas de que escapavam, é condená-las à falta de habitação, à fome, à sede, a violações, à separação das suas famílias, e, em muitos casos, à morte.
Uma linha principal de adaptação à crise climática é garantir casa e documentos para todas as pessoas.
Política livre de fósseis
Exclusão imediata das empresas, CEOs e acionistas que lucram a partir dos combustíveis fósseis, dos processos políticos e de políticas públicas.
As empresas de combustíveis fósseis sabem há décadas o impacto da sua atividade. A sua escolha é criar contra-informação e bloquear as alternativas necessárias. Estas estão diariamente a dirigir os processos políticos e a interferir com as políticas públicas.
A oligarquia dos combustíveis fósseis não pode ter lugar à mesa na hora de desenhar políticas públicas, como o caso da Jamila Madeira.
Decisores políticos não podem ter um passado de cumplicidade com a indústria fóssil – como foi o caso do ministro da economia, António Costa Silva.
O lobby – formal e informal – tem de ser transparente em Portugal e não pode permitir o lobby das indústrias e empresas culpadas pela crise climática.
Leituras Recomendadas:
Fossil Free Politics - https://www.fossilfreepolitics.org/
Stop the revolving door: fossil fuel policy influencers – https://corporateeurope.org/en/stop-revolving-door
Espaço público livre de fósseis
Parar toda a publicidade e patrocínios que legitimizam o mercado fóssil em todos os espaços públicos, como a televisão, rádio, redes sociais, escolas e faculdades, ruas e estradas, nos concertos, teatros, museus e estádios de futebol.
Permitiríamos que a gestão dum campo de concentração divulgasse a sua “marca” em espaço público? Então porque é que aceitamos publicidade das empresas que colocam 90% do seu investimento em combustíveis fósseis?
Não podemos permitir às empresas de energia fóssil, aviação, automóveis, indústria agropecuária ou turismo qualquer legitimidade social quando elas sabiam, sabem e alimentam o atual contexto de colapso climático que elas sabiam, sabem e alimentam. Portanto, toda a sua publicidade deve ser removida e proibida e estas empresas têm de ser retiradas das esferas social, cultural, educacional e científica – seja via patrocínios, seja via parcerias.
Qualquer divulgação pública desenhada pelas empresas poluentes é uma lavagem de imagem: enganando sobre os seus produtos ou serviços (greenwashing), normalizando a sua presença pública (logótipos em eventos ou projetos) ou banalizando o uso dos seus produtos (carros, voos, combustíveis, carne).
A publicidade existe exclusivamente para gastar recursos de que precisamos, mercantilizar potencial criativo e artístico e estimular consumos inúteis, aqueles que em crise climática não fazem qualquer sentido. Estes mesmos espaços podem antes ser usados para alertar para os perigos dos combustíveis fósseis ou para consciencializar para a justiça climática.
Adicionalmente, patrocínios para cultura e educação levam à influência directa da indústria fóssil sobre o que é falado, o que é ensinado, o que é investigado e qual é a resposta normalizada pelos meios de comunicação, escola e cultura em relação à crise climática. Estes espaços necessitam de ser independentes da indústria criminosa que gasta milhões por ano em contrainformação sobre a crise climática.
Leituras Recomendadas:
- Advertising and its Discontents – Subvertisers International - https://subvertisers-international.net/ , https://subvertisers-international.net/wp-content/uploads/2022/07/Advertising-and-its-Discontents-S.I.-2022.pdf
Dizer a verdade: Honestidade sobre o estado de crise climática
Todas as instituições têm de entrar em modo de emergência climática, tendo como foco central travar a crise climática.
Há um consenso científico e social de que travar a crise climática é a prioridade atual. Contudo, o sistema de ensino, as instituições judiciais, legislativas, sociais e os meios de comunicação continuam a agir como se não estivéssemos a enfrentar o maior desafio da humanidade. É necessário dizer a verdade às pessoas para que possamos tomar decisões informadas e realistas. Todas as decisões, debates e notícias têm de ter como enquadramento principal a crise climática.
Leituras Recomendadas:Sociedade civil: Declaração de Estado de Emergência Climática – Climáximo - https://www.climaximo.pt/declaracao-de-emergencia-climatica/Advogados: Lawyers are Responsible - https://www.lar.earth/Ciêntistas: World Scientists’ Warning of a Climate Emergency - https://climateemergencydeclaration.org/climate-emergency-declaration-from-thousands-of-scientists-goes-around-the-world-again/Jornalismo: Statement on the Climate Emergency - https://coveringclimatenow.org/projects/covering-climate-now-statement-on-the-climate-emergency/Cultura: Culture Declares Emergency - https://www.culturedeclares.org