Continuar a resistir à guerra em 2024
Ponto de situação do estado de emergência climática dentro do Climáximo em Dezembro de 2023
No verão passado olhámos para o mundo, para Portugal e para nós mesmas enquanto coletivo por justiça climática. Tivemos a coragem de ser honestas connosco e com a sociedade: não estamos apenas numa emergência global, estamos em estado de guerra. Vivemos perante uma guerra declarada pelas empresas e pelos governos contra a sociedade e o planeta, encoberta por uma falsa sensação de paz social e de impotência coletiva. Para fazer face a isto, lançámos uma nova declaração de emergência climática. Aceitámos a realidade. Em 2023, – ano em que as emissões continuaram a aumentar, e em que nos aproximámos de ultrapassar os 1.5ºC de aquecimento – acr ise climática exigia de nós uma rotura completa com o que tinha sido o Climáximo até então, e uma transformação enquanto coletivo e enquanto pessoas.
Perante esta realidade, comprometemos-nos a encontrar a coragem para fazer história e aceitámos três compromissos principais. Agora, passados 3 meses, avaliámos o nosso trabalho e queremos partilhar o que fizemos e o que ainda precisamos de fazer:
1) Aceitar que o governo e as empresas estão em guerra com a sociedade e o planeta.
- Pela primeira vez, compilámos o trabalho de pesquisa, debate e investigação dos últimos 8 anos num único Plano de Desarmamento e Plano de Paz. Neste apresentámos às pessoas o que consideramos ser necessário implementar para travar a guerra e para reconstruirmos a sociedade e o planeta. Recolhemos diversas críticas e questões, fomentámos o debate público nos nossos eventos e organizámos uma Assembleia de Resistência Climática que definiu os pontos principais de luta para 2024. Durante os próximos meses vamos rever e aprofundar as nossas propostas políticas. Sabemos que este será sempre um programa em construção pelas e entre as pessoas.
- Compreendemos que para travar esta guerra é preciso que nós, as pessoas normais, estabeleçamos um acordo entre nós sobre o que vamos fazer. A estratégia prioritária nestes meses foi abrir esta discussão pública. Assim, realizámos 21 ações, ao longo de 6 semanas, com centenas de pessoas envolvidas e dezenas de detenções. Ainda não conseguimos que a sociedade deixe de consentir com o genocídio em curso. Contudo, a crise climática passou a estar presente de forma permanente no debate público e mediático. Demonstrámos igualmente que os culpados desta guerra – empresas e governos – e as suas armas – infraestruturas fósseis, jatos privados, etc – não são intocáveis e têm de ser paradas. Em 2024 é preciso encontrar a coragem coletiva necessária para a sociedade enfrentar a realidade e agir para travar esta guerra.
- Os 50 anos da revolução dos cravos relembram-nos que grandes mudanças em pouco tempo são possíveis, quando o povo assim quer. Eleições antecipadas com 0 partidos a apresentar soluções para travar a crise climática demonstram que nos pedem para eleger os próximo executores da guerra declarada à vida.
- Assim, nos próximos meses, vamos exercer o nosso direito e dever de participação democrática. O único voto na defesa da vida atualmente é feito através da resistência e da disrupção, tal como da construção de um plano das pessoas para as pessoas, cuja
implementação seja feita através das nossas próprias mãos.
2) Construir a resistência e ripostar apesar dos riscos pessoais e organizativos que possamos
vir a correr.
- Em poucos meses, conseguimos mudar por inteiro o nosso funcionamento – criando novas equipas funcionais e capazes – e aumentar a nossa capacidade – estabelecendo uma rede de apoiantes que permite a participação alargada de dezenas de pessoas.
Explorámos novas formas de comunicação em diversas plataformas e tornou-se particularmente difícil acompanhar todas as novas pessoas. Reconhecemos a necessidade de melhorar a integração de novas apoiantes e de mobilizarmos mais pessoas. Identificámos a necessidade de capacitação, de melhorar o cuidado coletivo, a comunicação e agilidade interna, tal como de nos desafiarmos a novas aprendizagens feministas e à incorporação das aprendizagens atuais. - A decisão de agirmos de acordo com a realidade não foi e não é fácil. Muitas de nós enfrentámos diversas formas de repressão, desde violência policial e detenções ilegais, violência e ameaças de militantes de extrema-direita, penas de 1 ano de prisão por protestos pacíficos e políticos (convertidos em multas), … Foi igualmente desafiante a gestão da vida pessoal e laboral. Atualmente contamos com 9 casos em tribunal, 6 condenações e um total de 4300€ em multas. Enfrentamos estas consequências através da entreajuda e cuidado entre todas nós. Realizámos 2 concertos de angariação de fundos para multas – Animar a Mvlta – e temos uma pequena equipa legal que faz o seu melhor para acompanhar todas as pessoas, apesar da dificuldade em encontrar advogados que nos apoiem. Sabemos que há muitos outros riscos pela frente. Avançamos com determinação porque lutamos por tudo o que amamos e sabemos que as consequências de não agirmos agora são insuportáveis. O apoio coletivo entre nós e a solidariedade e palavras de força que diversas pessoas nos enviaram dão-nos coragem para continuar a fazer história.
3) Criar a coordenação que implementa a justiça climática dentro dos prazos ditados pela
ciência.
- A nível internacional organizámos, em conjunto com dezenas de outras organizações, a primeira conferência global de boicote à COP(28), a Earth Social Conference. Neste espaço estabelecemos novas alianças e reforçámos o nosso compromisso para estabelecer uma coordenação internacional com dezenas de outras organizações, de forma a mudarmos o sistema dentro dos prazos climáticos. Vamos continuar a trabalhar na organização da próxima Earth Social Conference, 2024 no México, desafiando novas organizações a enfrentarem e aceitarem que vivemos num estado de guerra global declarado pelos governos e empresas, e que só a sociedade em luta lado a lado os vai conseguir travar.
- A nível nacional, a nossa honestidade sobre o estado em que vivemos, e o que o momento atual exige de nós, permitiu estabelecer novas alianças. Agora, iremos explorar como vamos resistir a esta guerra em conjunto e construir um plano político de justiça climática e social.
2024 será um ano de disputa política a nível nacional e internacional, com eleições em Portugal e na União Europeia, com a celebração dos 50 anos do fim da ditadura fascista em Portugal, e com a intensificação da violência colonialista e imperialista, da brutalidade da crise climática e de crises sociais por todo o mundo. Cabe-nos garantir que é visível para a sociedade que estamos a viver uma guerra declarada pelos governos e empresas contra nós e contra o planeta. Cabe-nos mostrar que não só existe uma alternativa ao colapso civilizacional, mas também que é nossa a responsabilidade de lutarmos em conjunto contra esta guerra e por um mundo justo com a vida no centro.